sexta-feira, 31 de julho de 2009

O Quase secular futebol de São Bernardo


Foto: Equipe do E.C.São Bernardo - Anos 60 - No velho Estádio Ítalo Setti

Foto: Equipe do Palestra de São Bernardo em 1950.


Em praticamente 20 anos de residência em São Bernardo do Campo, constatei algo básico: A Nossa população é “rotativa”. O que isso significa? Simples: Os São-Bernardenses de outrora, que fundaram a maioria das instituições tradicionais da cidade já morreram. Suas famílias, que nessa antiga cidade tinham grande influência nos acontecimentos e na vida pública, tiveram a sua importância muito reduzida com o acelerado crescimento populacional, e a maioria dessas grandes instituições, ou sucumbiu, ou sobrevive em condições precárias.

E este é o caso de nosso futebol.


Podemos afirmar que o futebol no Brasil nasceu em São Bernardo. Afinal, em fins do Século XIX, quando foi concluída a Vila de Paranapiacaba (Alto da Serra), os ingleses já tinham ali um campo de futebol, e já praticavam o esporte (mesmo com regras distorcidas) antes da primeira partida realizada em São Paulo, por intermédio de Charles Miller. E Paranapiacaba pertencia a São Bernardo.



Mas o futebol chegou aos principais núcleos urbanos do velho município, creio eu, por meio da influência da própria Capital, nos anos 10, quando aqui proliferavam equipes, principalmente em São Caetano, Santo André e São Bernardo. Desta época são os clubes pioneiros de nossa região: São Caetano Esporte Clube e Primeiro de Maio Futebol Clube. Em São Bernardo, o esporte organiza-se de verdade em fins da década de 1910, e início da década de 1920. Nesta época nascem duas grandes equipes: A.A.Internacional e A.A.São Bernardo.



Mas, as duas equipes, que nasceram do futebol de várzea de São Bernardo, tiveram vida efêmera, e já não mais existiam na metade da década de 1920. A “Villa” de São Bernardo ficava sem representação futebolística, e voltava-se para a várzea. Enquanto as equipes dos na época distritos de São Caetano e Santo André cresciam.



Aqui, organizava-se uma boa competição. O Clássico dos “de cima” contra os “de baixo”. Alguns afirmam que os “de cima” eram os moradores da atual Rua João Pessoa, e de todas as outras que estavam “para o lado de cima” da Igreja Matriz. Desta forma, os “de baixo” eram os que habitavam a porção da vila que estava logo abaixo da igreja, nas Ruas Padre Lustoza, Rio Branco (em suas porções inferiores) etc.

Outros afirmam que “os de cima” eram os que habitavam a Rua Marechal Deodoro em sua porção “acima” da Igreja Matriz, no sentido do atual Ferrazópolis. E que “os de baixo” eram os que habitavam a porção inferior da rua em relação a igreja, a porção que ficava em direção ao atual Paço Municipal. Seja lá como for, esta era uma divisão criada apenas para existir a formação de times completos, que pudessem se enfrentar, e não uma divisão motivada pela rivalidade ou por outras questões. E era assim que o futebol da cidade ía vivendo.



Certo dia, ao observar uma dessas partidas, Dante Setti imagina a criação de uma única equipe, que pudesse representar a “sua São Bernardo” nos gramados. Um clube “grande”, e que mobilizasse toda a torcida em torno de um único representante. E Juntamente com Vicente Ragghianti e Itagiba de Almeida, a idéia é levada a frente, e em 3 de Fevereiro de 1928, no Cine São Bernardo, realiza-se uma assembléia que objetivava a fundação de uma nova agremiação. A Platéia se divide entre antigos torcedores do Internacional e da Associação Atlética, que sugerem vários e vários nomes, até que vem a proposta mais coerente: Se é para representar a cidade, o time teria que se chamar São Bernardo! E assim foi! Em 3 de Fevereiro de 1928, funda-se o “Sport Club São Bernardo”, com o negro e o branco em seus uniformes.



Nascia então uma grande equipe, grande e vencedora. O São Bernardo defendeu o orgulho dos moradores da velha “Villa”, transformando-se em uma equipe imbatível, odiada por Sancaetanenses e Andreenses, que depreciavam a vila por seus aspecto rural, que contrastava com a paisagem urbana dos dois distritos, mas que no futebol, nada conseguiam contra os “batateiros” de São Bernardo.



O “Reinado absoluto” do São Bernardo como a única agremiação da cidade, como sonhava Dante Setti, durou até 1935. Em 1935, Alfredo Sabatini, filho de Samuel Sabatini (dono de um armazém) e que era jogador do São Bernardo, foi preterido de um jogo da equipe fora da cidade, sem aviso prévio, o que provocou revolta em Alfredo e em seu pai, que resolveram fundar uma nova agremiação para “bater neles”. “Neles” era o São Bernardo.



Desta forma, nasce em 1º de Setembro de 1935 o Palestra Itália de São Bernardo. O Palestra tinha a pretensão de ser uma “pedra no sapato” do São Bernardo, mas nunca conseguiu esse feito, a rivalidade, que era até grande, não se difundia muito, pois na pequena cidade de então, todos se conheciam, e muitos jogavam pelas duas equipes. Assim, a rivalidade geralmente durava 90 minutos, e depois deles, geralmente quem comemorava era o São Bernardo. Historicamente, a vantagem alvinegra nos clássicos é imensa, e no entanto, isso nunca provocou o desdém dos torcedores do São Bernardo, ou do “Sport”. Cria-se em São Bernardo um novo sentido para a rivalidade futebolística, uma “rivalidade solidária”, pois Palestra e São Bernardo sempre dependeram um do outro, e movimentavam o futebol da cidade. Assim sendo, essa “solidariedade” foi demonstrada em diversas oportunidades, a principal delas talvez, tenha ocorrido nos anos 50, quando o Palestra perdeu o seu campo na atual Praça Lauro Gomes. Ali, a equipe alviverde correu risco de extinção, mas o São Bernardo cedeu o Estádio Ítalo Setti (que ficava no cruzamento da Rua Marechal Deodoro com a Avenida Francisco Prestes Maia) ao rival, para que ele não encerrasse as suas atividades.



Nos anos 40, Getúlio Vargas obriga a nacionalização de todas as instituições estrangeiras, e os clubes que representavam colônias, tiveram que acatar a nova lei. Assim o Palestra Itália da Capital virou Palmeiras. O Hespanha de Santos virou Jabaquara, o Germânia da Capital virou Pinheiros, e o Palestra Itália de São Bernardo... Tirou o Itália e continuou Palestra! Obviamente isso ocorreu pela pequena projeção que a equipe de São Bernardo possuía, mas é bom lembrar que os dirigentes do alviverde procuraram o temido DIP – Departamento de Imprensa e Propaganda do Governo Vargas, preocupados com a nova lei, e receberam sinal verde para prosseguir com o nome Palestra, coisa que o “primo rico” da Capital não conseguiu.



Em fins dos anos 60, o São Bernardo também perde o seu campo. E a partir daí, as duas equipes que já trilhavam o profissionalismo desde 1950, começam a “descer a ladeira”. O Próprio São Bernardo acabou se afastando das competições profissionais, e o Palestra também, depois de algumas tentativas de permanência. Tudo se concentrava no amadorismo, e no esporte amador. No basquete por exemplo, o São Bernardo fez fama com jogadores que são referência para o esporte no Brasil.


Em fins dos anos 70, uma equipe amadora da cidade desperta atenções, era o Aliança Clube do Rudge Ramos, campeão do “desafio ao galo” (o maior torneio de futebol amador do Brasil até pouco tempo atrás) acaba aderindo ao profissionalismo, e desponta como o principal clube da cidade na época (era a grande pedra no sapato do Palestra nos campeonatos amadores da cidade – o São Bernardo vivia péssima fase no futebol, que estava praticamente inativo). Ainda nos anos 70, o Aliança conquista o troféu ACEESP (Associação dos Cronistas Esportivos do Estado de São Paulo) e bate ás portas da primeira divisão do Campeonato Paulista, foi por pouco, mas muito pouco, que São Bernardo não viu o seu primeiro clube disputando a principal divisão do futebol Paulista.

No entanto o Aliança era uma mera equipe de várzea, sem patrimônio nenhum, e em fins dos anos 70, o São Bernardo absorve a equipe de Rudge Ramos e volta ao profissionalismo. Nos anos 80, em pelo menos duas oportunidades, o “Sport” esteve ás portas da Série A1. Estas foram e são até hoje as melhores colocações conquistadas por uma equipe de São Bernardo do Campo no futebol. O Palestra, vivia dias difíceis, mas fazia sucesso no campeonato amador da cidade, e os jogos, os clássicos entre as duas equipes ainda lotavam o Baetão!


Nos anos 90, o São Bernardo vai aos poucos desaparecendo das competições profissionais, e em 2002 faz a sua última participação, participação vergonhosa, diga-se de passagem. Em seus últimos tempos, o público já rareava, e poucos se lembravam do passado de glórias da equipe.


O Palestra, está aí até hoje, disputando a quarta divisão do campeonato em um de seus melhores anos, graças a uma feliz parceria com o Santo André, herdeiro dos grandes (e massacrados) rivais dos São-Bernardenses.
Perdeu-se no tempo e na memória de nossa população um dos mais tradicionais clássicos do futebol de São Paulo.


Para saber mais sobre o São Bernardo: www.qsl.net/pu2tjq/ecsb
Para saber mais sobre o Palestra: www.freewebs.com/palestrasb

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